terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

O vigor dos Mitos

Antônio Mesquita Galvão *

O homem sempre teve medo de muitas coisas, como a morte, a solidão, a doença, a injustiça e as ameaças metafísicas. Por isso adotou os mitos. O culto aos mitos, revela que antes das religiões e das crenças, o homem dissipou, através deles a soma de seus medos. O ser humano, por conta de sua finitude e limitação, muitas vezes tem medo de viver, e por conta disto sempre buscou cultuar a memória de heróis, semideuses, demiurgos e guerreiros, vencedores, das ameaças da natureza, nos confrontos com os seres (naturais ou sobrenaturais).
Quem viaja pela Grécia sente pulsar, como legendas vivas, os inúmeros mitos que por lá surgiram e que povoam o imaginário humano do mundo inteiro, até hoje. Os modernos poetas helênicos aconselham os visitantes: "Viva seu mito na Grécia". Desde o mito, como um assessório da vida, a pessoa é convidada a ver mais, fazer mais e ser mais. Nisso consiste o ideal humano na busca da felicidade. Homero afirma, em sua Odisséia que "você não sentirá a força do mito, na procura do caminho do Odisseu (Ulisses) nem nas memórias dos Lacedemônios (espartanos) se você não procurar encontrá-los em seu coração". Precisa ser um pouco grego ou pensar como eles para entender isso de forma adequada. O vigor do mito só pode ser desfrutado pela sensibilidade do coração.
O estudo dos mitos, dentro de algumas perspectivas, como da psicologia junguiana, por exemplo, é fundamental para que o ser humano se conheça a si mesmo. O mito como parte de um jogo dialético, responde aos porquês do homem de todas as épocas. Apesar de apresentar uma explicação encarada como fantástica e ilusória, não há como negar sua forte carga de imagens, símbolos e alegorias capazes de penetrar na mente humana, justificando sua apropriação pela psicanálise. Por detrás da formulação de um mito sempre vamos encontrar alguma referência a um estado de necessidade do ser humano.
A adição do mito ao con-texto da existência humana torna-se pré-texto para a eleição de algo superior, um socorro, um esteio. O mito assume assim o papel de uma ferramenta psicológica e afetivamente saudável, plena de objetivos de valor e de sentido. O mito ajuda o homem a delinear um sentido para a sua vida. Na verdade, há milênios o homem cria seus mitos que refletem, (até hoje) a sua própria natureza, os sentimentos interiores, medos, desejos mais profundos, sempre acrescidos por elementos que remetem a existência à imortalidade, ao prazer e a satisfação de cada sentimento e emoção (humana), que se torna divina.
Culturalmente, o mito é sentido e vivido antes de ser inteligido e formulado. Assim, ele é a palavra, a imagem, o gesto, que circunscreve o acontecimento no coração do homem, antes de fixar-se como narrativa. A despeito de algumas correntes tentarem reduzi-lo a simples conjunto de lendas, há no mito toda uma potencialidade universal. Poucos se dão ao trabalho de verificar a verdade que existe no mito, buscando apenas a ilusão que o mesmo contém.


* Doutor em Teologia Moral

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